CELAC – A Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), que reúne atualmente 32 países, realizou uma conferência no México, depois de um hiato de cinco anos. A iniciativa partiu do presidente López Obrador visando dar uma sacudida nas questões particulares que dizem respeito ao bloco que vai do México até a Patagônia. Esperava-se ainda que fosse discutida a função da OEA (Organização dos Estados Americanos) na região, visto que nos últimos anos a ação deste organismo tem sido bastante intervencionista. Não que isso seja uma novidade, mas havia a expectativa de fortalecer esse bloco sem os Estados Unidos, justamente para isolar a OEA. O Brasil foi o único país do bloco a não participar, porque o presidente Bolsonaro decidiu sair da Celac, alegando que ali é um antro de comunismo.
Não foi o que se viu na reunião, que ao final resultou bastante tensa, porque se não tinha a presença incômoda dos Estados Unidos, teve a dos seus lacaios. Os presidentes da Colômbia, Ivan Duque, do Paraguai, Mario Abdo e do Uruguai, Lacalle Pou, representaram muito bem os interesses do império acusando Cuba e Venezuela de serem ditaduras, criando certo tumulto no ambiente. Nada que não fosse rebatido com classe por Díaz Canel, de Cuba, e Nicolás Maduro, da Venezuela, em cujos países não se vê, por exemplo, assassinatos sistemáticos de lideranças sociais como no policialesco estado da Colômbia.
E assim, entre farpas e provocações, a reunião seguiu seu curso com os governantes tentando chegar a algumas pautas de consenso. O tema da OEA acabou não sendo debatido, o que foi considerado uma derrota para os organizadores, mas chegou-se a um documento final que apontou as preocupações com as mudanças climáticas, o desenvolvimento sustentável e ações unificadas contra a Covid-19.
Também foi aprovada a criação de um fundo para apoiar os países que tiverem desastres ambientais e discutiu-se uma proposta de criação de uma agência espacial regional, a Agência Latino-Americana e Caribenha do Espaço (Alce). Esse último tema foi considerado pela imprensa burguesa como uma excrescência diante de tantos problemas mais urgentes, mas é bom lembrar que a questão “espaço” leva em consideração o uso de satélites para as comunicações, o que é absolutamente estratégico hoje em dia e que segue sendo um nicho dominado pelos Estados Unidos.
Por fim, apesar da ação desarticuladora dos presidentes da Colômbia, Paraguai e Uruguai – chamados à boca pequena de viúvas do Grupo de Lima – o grupo aprovou documento com uma série de propostas e ações comuns além de exigir o fim do bloqueio econômico a Cuba, bem como reconhecer o direito da Argentina às Malvinas.
Um tema importante para a região do Caribe, a migração, acabou sendo discutido apenas de forma tangencial e sem aprofundar nas causas. No documento final, fala-se em concretizar processos migratórios que otimizem o desenvolvimento dos países de origem, mas não entram em detalhes sobre que desenvolvimento seria esse, uma vez que no modo capitalista atual isso é completamente impossível.
O sociólogo alemão Gunder Frank já desvendou esse “mistério” alertando que, no capitalismo, o único desenvolvimento possível aos países da periferia do capital é o desenvolvimento do subdesenvolvimento. E é justamente isso que provoca as levas de migrantes, com milhares de pessoas em fuga, tentando encontrar uma forma de viver melhor.
Terminada a reunião, as redes sociais iniciaram sua batalha comunicacional. Nos nichos da direita latino-americana, a Cumbre foi considerada um rotundo fracasso, com os holofotes voltados para as provocações de Duque, Pau e Abdo. Já nos espaços da esquerda liberal as análises eram de que a reunião havia sido uma grande vitória de Obrador. Nem tanto ao céu, nem tanto à terra.
Não foi fracasso, nem representou grande vitória. Foi sim um momento importante porque reuniu todos os governantes da região, o que permitiu um reconhecimento das forças que estão em disputa e também apontou a construção de algumas ações comuns. Coisa pouca e sem muita densidade, mas de qualquer forma, mostrou aos Estados Unidos que o bloco latino-americano e caribenho ainda tem pernas para caminhar e dentes para morder, ainda que claudicante e sem muita força na mordida. A ausência do Brasil pesa a favor do império, a conjuntura continua ainda muito frágil para os governos ditos progressistas e falta uma proposta realmente vigorosa de esquerda, anti-capitalista, como já houve durante os anos de Hugo Chávez.