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O papel da imprensa no esvaziamento das bolhas extremistas

 

Ao invés de apontar um vencedor consensual, o resultado das eleições presidenciais acabou por escancarar a formação de bolhas extremistas. Tais bolhas constituem um enorme desafio não apenas para o presidente eleito, mas também para a imprensa, o jornalismo e os canais de comunicação, por onde flui a maior parte das informações que alimentam a polarização político-ideológica no país.

Os veículos de comunicação, profissionais autônomos e os influenciadores digitais (1) são protagonistas neste processo de fracionamento da sociedade brasileira. Cabe a eles a responsabilidade de fazer a filtragem das informações que ampliarão ou diminuirão o sectarismo político e a xenofobia social dos grupos que se recusam a aceitar a vitória do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

Trata-se de uma situação inédita para a imprensa e para os profissionais, pois a realidade política que emergiu do segundo turno das eleições presidenciais aponta no sentido de uma maior preocupação social com as causas e consequências do surgimento das bolhas extremistas do que com o noticiário factual convencional. Em última análise, o jornalismo e a imprensa estão diante do agravamento do dilema entre seguir a velha regra da isenção ou assumir a necessidade de neutralizar a polarização político-ideológica.

Não é uma escolha simples porque mexe com comportamentos, normas e valores vigentes há décadas na profissão. A reação extremista à vitória de Lula desorientou a maior parte dos jornais brasileiros e acelerou a necessidade da mudança de estratégias editoriais. Surgiu uma situação em que a defesa da democracia deixou de ser retórica para assumir um caráter concreto, ou seja, garantir o respeito ao resultado de uma votação popular e a crítica à formação de bolhas golpistas.

Ficou também claro que as fake news não são apenas um erro pontual a ser corrigido pelos institutos de checagem, mas um instrumento político central na estratégia dos movimentos de extrema direita, pois é através delas que se consolidam a unidade interna e o voluntarismo das bolhas extremistas. A avalanche informativa e as redes sociais virtuais aumentaram de tal forma o fluxo de notícias que as pessoas acabaram confusas diante de tanta informação, ficando quase impossível eliminar as fake news.

A imprensa precisa combater fake news e esvaziar as bolhas extremistas. A imagem mostra bolsonaristas insatisfeitos com o resultado das urnas.
Ato de bolsonaristas insatisfeitos com o resultado das urnas – Foto Wikimedia/CC

A insegurança e incerteza sobre a autenticidade das notícias levaram os extremistas de direita à formação de grupos ideologicamente homogêneos, dentro dos quais as pessoas recebem o mesmo tipo de informação, não importa se verdadeira ou falsa. Foi criado o ambiente ideal para a disseminação em massa de fake news, o que alimentou o fenômeno de radicalização descrito em detalhes pelo professor norte-americano Cass Sunstein (ex-assessor do presidente Barack Obama), no livro Going to Extremes, (publicado em 2009, sem tradução no Brasil).

Estamos presenciando uma situação nova em matéria de ressaca pós-eleitoral. Tradicionalmente, os vencedores costumavam exibir orgulhosamente sua opção eleitoral em camisetas e adesivos, mas o que assistimos hoje é um protagonismo dos derrotados, principalmente através de bandeiras nacionais em carros e da profusão de roupas nas cores verde e amarela. Há claramente uma posição desafiadora e uma recusa em aceitar a derrota, mesmo que esta posição busque se auto justificar usando fatos e dados absolutamente inverídicos. Não importa a credibilidade e sim a repetição incessante da mentira, até que ela passe a ser reproduzida sem questionamentos.

A radicalização e polarização ideológicas já estão transbordando o âmbito partidário para atingir as relações humanas, como mostram as multiplicações de vídeos e postagens na internet de pessoas hostilizadas ou discriminadas por integrantes dos grupos extremistas de direita. O fenômeno é mais intenso na região sul do país, especialmente em Santa Catarina e Paraná. A imprensa e o jornalismo não podem tratar estes casos de forma burocrática, porque posturas tolerantes ou supostamente isentas contribuem para incentivar ainda mais o extremismo de direita.

(1) Imprensa e jornalismo são conceitos distintos. A imprensa é o negócio de disseminar e vender notícias. Jornalismo é a profissão responsável pela produção de notícias. Influenciadores são indivíduos, em sua maioria sem formação técnica jornalística, que divulgam e comentam fatos, dados e eventos pela internet.

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O papel da imprensa no esvaziamento das bolhas extremistas
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Carlos Castilho
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