por Carlos Castilho
Nosso principal dilema até as eleições presidenciais deste ano não será a escolha de candidatos, mas como separar as informações distorcidas ou falsas das que podem ser consideradas confiáveis. Teremos que nos preocupar mais com números, fatos e eventos do que com siglas e nomes, na hora de decidir como e em quem votar.
Até outubro, estamos condenados a viver uma avalancha de incertezas que tanto pode nos empurrar para escolhas absurdas alimentadas por dados falsos ou enviesados, como pode nos ensinar a conviver com as incógnitas que a internet está gerando nesta fase de transição da era industrial para a digital.
Por enquanto, cerca de 1/3 dos 140 milhões de eleitores brasileiros tentam manter-se a margem das incertezas politicas segundo as mais recentes pesquisas do IBOPE, mas esta situação deve mudar a medida que o bombardeio noticioso se intensificar, durante a propaganda pela televisão.
A origem de tudo isto está na informação, especificamente na informação eleitoral. Uma campanha eleitoral é por excelência um ambiente de saturação informativa cujo objetivo último é condicionar a decisão de voto do cidadão comum. A grande diferença é que, no passado, nossas escolhas eleitorais eram determinadas basicamente por fatores ideológicos enquanto, agora, as opções dependem fundamentalmente do nosso grau de informação.
Era muito mais fácil escolher entre propostas ideológicas porque elas geralmente se limitavam a duas ou três. Hoje, somos confrontados com uma avalancha de informações disseminadas por todos os candidatos, o que nos desorienta e gera insegurança porque estamos despreparados para lidar com a desinformação (informação distorcida) e as notícias falsas (fake news).
odo o mecanismo de condicionamento de opiniões individuais tornou-se muito mais complexo na era digital porque não só o volume de informações tornou-se gigantesco como também as modalidades de desinformação e falsificação noticiosa ficaram incrivelmente mais sofisticadas e de disseminação quase instantânea por redes sociais, como Facebook.
Grandes redes sociais acabam com o sonho idílico de uma internet livre
O controvertido papel dos “influenciadores”
A persuasão eleitoral realizada através de redes sociais utiliza mecanismos que tornam muito difícil identificar a origem, sem falar no fato de que as mensagens são alteradas centenas de vezes durante um curto espaço de tempo. É cada vez mais frequente o uso de robôs eletrônicos para administrar a disseminação de mensagens e a captação de informações sobre os destinatários das mesmas.
Entre os vários complicadores do processo de formação de opiniões eleitorais através da internet está o papel, cada vez mais importante, desempenhado pelos chamados influenciadores. Teoricamente seriam pessoas que funcionariam como uma espécie de curadores de informações, recomendando notícias confiáveis. Mas o papel dos influenciadores como pessoas de referência na cacofonia noticiosa na Web foi distorcido de duas maneiras: como disfarce para cabos eleitorais e fator de comercialização de produtos ou serviços.
Os grupos políticos de extrema direita foram os primeiros a criar influenciadores para promover candidatos e causas. Eles foram decisivos na eleição de Donald Trump, nos Estados Unidos em 2016 e, agora aqui no Brasil, com a forte presença nas redes sociais dos cabos eleitorais do capitão reformado Jair Bolsonaro. O outro fator é a comercialização das sugestões feitas no Facebook e Twitter. Os softwares de geração de curtidas inflam a popularidade dos influenciadores através de dados impactantes sobre número de seguidores e de likes para alimentar negócios de indivíduos dispostos a promover marcas e personalidades.
Os líderes pensantes
Muito recentemente surgiu na internet a figura dos “lideres pensantes”, indivíduos de reconhecido valor intelectual, em geral pesquisadores acadêmicos ou intelectuais, que não se preocupam em buscar seguidores e nem curtidas em massa. Para eles, o principal é a investigação e produção de conhecimentos, sem preocupação com curtidas, seguidores e muito menos com a comercialização de suas ideias. É o caso de muitos autores que publicam textos na plataforma Medium.
Geralmente são grupos pequenos que se formam lentamente e que tendem a formar verdadeiras comunidades de indivíduos que compartilham preocupações e objetivos. Os lideres pensantes, a rigor, não funcionam como curadores de informações porque raramente fazem recomendações e seus seguidores. São vistos como desbravadores de áreas inexploradas do conhecimento, escondidos em nichos específicos dentro da internet.
A rede Facebook é hoje o centro da grande polêmica sobre a proliferação de notícias falsas e desinformação durante campanhas eleitorais. Há uma tendência crescente rumo à regulamentação do uso da internet, em especial das redes sociais, para tentar neutraliza os efeitos desorientadores da avalancha de fake news.
A regulamentação tranquiliza as pessoas mais assustadas com as incertezas geradas pela internet, mas para a maioria dos pesquisadores digitais ela é quase um sinônimo de falta de alternativas. A normatização do espaço cibernético é tecnicamente ineficiente diante da mutação constante das tecnologias digitais de comunicação, vai custar muito dinheiro e sua eficácia politica ainda é uma incógnita.
O paradoxo digital
Trata-se de uma iniciativa que vai exigir pessoal especializado para varrer a internet em busca de robôs produtores de notícias falsas, funcionários do poder judiciário para julgar e condenar os acusados, e finalmente, instituições encarregadas de administrar o cumprimento das penas. Uma considerável burocracia, paga com dinheiro público, e cujo ritmo de funcionamento dificilmente chegará perto da vertiginosa capacidade de produção dos robôs eletrônicos que alimentam a guerra suja das notícias falsas.
O quadro sumariamente descrito acima mostra a necessidade de mudarmos nossos comportamentos políticos em eleições futuras. A disseminação massificada de dados, fatos e eventos, eleitoralmente pré-formatados, já não é vista como um fator positivo na democratização do fluxo online de informações. Há um esforço coletivo de mais de 130 organizações internacionais, a maioria no âmbito jornalístico, buscando instrumentos, processos e leis capazes de controlar a multiplicação da desinformação e das notícias falsas na internet, mas dificilmente os resultados serão sentidos antes de um ou dois anos.
Assim, mesmo rodeados pela mais sofisticada e complexa gama de gadgetseletrônicos digitais visando eliminar as fake news , paradoxalmente, as nossas melhores alternativas na hora de decidir o voto ainda parecem ser a preocupação em auto imunizar-nos contra a radicalização gerada pelos influenciadores online e a velha conversa olho no olho.