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Não há meia democracia

Desde 2018, estamos assistindo à ruptura do consenso democrático surgido após o fim da ditadura militar e assumido pelo establishment político/empresarial, incluindo a grande imprensa brasileira. Foram justamente os jornais e a TV os primeiros a sentirem na carne os efeitos da ascensão do populismo autocrático. O governo Bolsonaro mostrou, desde o seu início, um olímpico menosprezo pelos princípios básicos da democracia, como a transparência pública, o respeito às decisões de justiça, a opção preferencial pela solução pacífica e negociada de conflitos, a recusa da tortura, censura e violência física.

A imprensa não percebeu, ou não quis perceber, que o debate público migrou para outro espaço político a partir de 2016, quando da derrubada do governo Dilma Rousseff. Até então, a luta política acontecia dentro do campo democrático, mas a partir da eleição de Jair Bolsonaro, em 2018, ela passou a ser entre quem segue os princípios da democracia e os adeptos do autoritarismo populista de viés fascista (1).

#Ditaduranuncamais (Reprodução)

O descuido da imprensa

O professor Eugênio Bucci definiu com perfeição o dilema atual da imprensa brasileira na sua intervenção na live dos 20 anos de fundação do PROJOR ( Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo) ao afirmar que “houve um descuido da maioria das redações em identificar a natureza da candidatura que acabou vitoriosa em 2018…era uma candidatura antidemocrática porque havia elogios a torturadores, uma certa idolatria do golpe de 1964, …. e um discurso machista, misógino e racista”. Bucci acrescenta ainda: “… se houvesse (hoje) na Alemanha uma candidatura nazista… ela seria denunciada (legalmente) porque o culto do nazismo é incompatível com a ordem democrática alemã, assim como o culto da ditadura, da tortura, da censura à imprensa é incompatível com o pacto nacional que gerou a democracia na qual tentamos sobreviver aqui” (2).

A erosão interna no pacto democrático nacional é uma das consequências da incapacidade da imprensa de mostrar aos seus leitores, ouvintes, telespectadores e usuários da internet a inexistência de meio termo quando se trata de exercício da democracia. Estamos hoje diante do que o professor Conrado Hubner Mendes chamou de “ilegalismo autoritário” (3), ou seja, o avanço gradual do desmanche das normas legais que garantiam a democracia brasileira através da Constituição de 1988.

As indecisões da imprensa permitem que as tendências políticas de viés fascista encontrem espaço na opinião pública para promover uma “castração” da democracia brasileira.

Este texto foge ao padrão adotado até agora na imprensa. Não é mais possível ser um mero observador do que acontece no país quando o sistema político que garante o exercício da nossa profissão pode sucumbir ante a ameaça do autoritarismo.

(1) Preferimos usar a expressão viés fascista porque o fascismo clássico está associado a uma conjuntura italiana nos anos 30 e 40. O projeto bolsonarista mantém várias semelhanças com o modelo político do ditador italiano Benito Mussolini, como o autoritarismo, a militarização, o machismo e as motociatas, mas não é a mesma coisa.

(2) Trechos da fala de Eugênio Bucci (ver íntegra em https://fb.watch/cqB-AgLFXe/) foram abreviados e levemente editados em favor da clareza e concisão.

(3) Ver artigo “Ilegalismo autoritário é obra de juristas”.

A democracia em risco

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Sobre a democracia e o voto

A terceira etapa do nazi-fascismo no Brasil não poderá ser derrotada somente nas urnas

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Não há meia democracia
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Na democracia, assim como na gravidez feminina, não há meio termo. Não há meia democracia. É ou não é. Assume-se ou rejeita-se. Mas a imprensa parece ignorar este fato e tenta conviver com um governo que adota princípios que negam na prática o compromisso democrático. A indefinição é o grande dilema da mídia brasileira às vésperas de um pleito que vai definir o futuro do país pelos próximos anos.
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