No dia 15 de agosto, o ex-presidente Lula participou da “Aula aberta: Universidade Pública e Democracia”, evento realizado pelo Coletivo USP Pela Democracia. O encontro também contou com a presença de personalidades como Fernando Haddad, Ermínia Maricato e Marilena Chauí.
Durante seu discurso, Lula destacou algumas realizações da sua gestão, como a diminuição da dívida pública, redução da inflação para 4,5% e investimento nas universidades.
Em seguida, ele afirmou que o financiamento estudantil deveria ser maior, e que mesmo que algumas pessoas não consigam pagar o governo imediatamente, no futuro pagarão, melhorando a capacidade produtiva no país. “Nós temos que começar a perguntar quanto custou não fazer as coisas no tempo certo nesse país”, discursou.
“Quanto custou não alfabetizar esse país na década de 30 ou 40? Quanto custou não fazer a urbanização quando começou a evasão do campo para a cidade? Quanto custou a esse país a gente não ter feito a reforma agrária quando foi feita no mundo inteiro? Fica muito mais caro”, questionou.
Lula alegou ter deixado o Brasil bem encaminhado como a sexta economia do mundo e ainda em ascensão. O petista alegou que esperava que na segunda década deste século, o país estivesse entre os melhores, superando até mesmo a Inglaterra e França, disputando a quarta posição na economia mundial. “Eu trabalhava com esse sonho”, afirmou.
“E o que aconteceu? Esse país que chegou a ser a sexta economia do mundo e agora é a décima terceira. Esse país que era motivo de orgulho em todos os continentes, virou pária”, disse.
Encaminhando para o final, o ex-presidente pediu que a juventude não parasse de acreditar em si mesma e votar nos políticos que acredita e destacou: “não desanime da vida ou da luta, se a gente não luta enquanto a gente é estudante, a gente vai lutar quando a gente tem 70 (anos) ou 80 (anos)?”, perguntou.
“Eu só vou sossegar quando o filho de uma empregada doméstica puder sentar no mesmo banco da universidade que a filha da sua patroa e disputar a mesma vaga em igualdade de condições e para isso nós temos que garantir emprego, comida e salário para as pessoas. Quando todo mundo tiver as mesmas condições para disputar uma vaga, a gente vai ver quem é inteligente e quem não é”, completou.
Necessidade de diálogo com a população
A escritora, professora e filósofa Marilena Chauí deu início ao evento relembrando as mais de 681 mil vítimas da covid, 33 milhões de famintos e 22 milhões de desempregados, e se referiu a essa atual situação brasileira como “crueldade”.
“Um filósofo há muito tempo atrás escreveu que a covardia é a mãe da crueldade”, destacou. “O covarde, como é medroso, precisa sem cessar exibir signos e sinais de força: armas, milícias, mortes”, disse.
Segundo Chauí, o Brasil vive no ódio e cinismo, mas salienta a necessidade de “recuperar a República”. Segundo ela, para isso, é preciso institucionalizar todas as áreas do poder executivo, refazer todo o campo dos direitos sociais e encontrar um caminho “pelo qual a reforma política libere o legislativo do peso que lhe cabe e recupere a independência do judiciário, que desde a Lava Jato se tornou uma questão de luta para nós… é preciso refazer o Brasil”.
A filósofa chamou a atenção para a forma como a direita opera nas redes sociais, e destaca que os recursos da esquerda são menores. De acordo com ela, existem duas tarefas necessárias. A primeira é conversar com as pessoas, no dia a dia, a respeito da atual situação política do Brasil. “Conversar com as pessoas explicando que esse Auxílio Emergencial só foi possível porque as esquerdas votaram, senão não sairia… isso a população precisa saber”.
A segunda tarefa é fazer a população compreender que a mudança terá um ritmo lento diante do que será deixado por Bolsonaro. Chauí ressalta a importância da recuperação da economia para que os direitos sociais sejam “recuperados e refeitos”, sendo imprescindível para a democracia.
“Onde nós estivermos, a nossa voz tem que ser ouvida, ela tem que se espalhar por todo o Brasil”
Questão urbana
Já a arquiteta, urbanista e ativista Ermínia Maricato chamou a atenção para a questão urbana do Brasil: “85% do que se constrói nesse país não tem a participação nem de arquitetos, nem de engenheiros, como se isso fosse luxo” e exigiu que a pauta seja levada à agenda nacional. Segundo ela, a maior parte dos domicílios brasileiros é informal, sem tratamento de esgoto.
Durante seu discurso, Maricato alertou para a falta de acesso à moradia formal e de qualidade, e pediu reforma urbana. De acordo com a professora, a Constituição de 88 assegura esse direito, mas o Estado não está cobrindo, apesar do dever.
Questão racial
A geóloga e professora Adriana Alves se referiu aos problemas causados pelo atual governo como “uma possibilidade de reconhecer os erros do passado” e construir um futuro em que as mudanças ajudem a consolidar uma democracia que supere as injustiças.
Alves falou sobre a questão racial, chegando a citar a menção de Bolsonaro ao peso de negros como “arroba”, medida que costuma ser usada para animais. Ela destacou o fato do Brasil ser um dos últimos países a abolir a escravidão, e mesmo o fazendo, abdicou de políticas públicas, causando desigualdade a enorme desigualdade racial na política.
“Na atual conjuntura política, nós somos 16% de senadores e senadoras, 24% de deputados e deputadas, 32% de prefeitos e prefeitas e 47% de vereadoras e vereadores. […] Tais números significam que várias das políticas públicas voltadas a nossa população são formuladas a partir de um lugar de branquitude e de concessão dessa branquitude.”
A professora também citou o índice no judiciário: apenas 12% dos magistrados são negros, em um país cujos negros são 67,7% da população carcerária. “Eu não consigo não pensar em uma relação de causa e efeito desses números”, alegou.
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