Occupy – No início desta semana, a manifestante do movimento Occupy Wall Street Cecily McMillan foi condenada a até 7 anos de prisão por um júri popular em tribunal de Nova Iorque (EUA). Ela foi acusada de agredir um policial em março de 2012, na comemoração de seis meses do início do Occupy.
Em entrevista ao portal Democracy Now, o advogado de McMillan, Martin Stolar, considerou o julgamento abusivo e que o juiz negou o pedido de fiança. O policial Grantley Bovell ficou com um olho roxo por uma suposta cotovelada da manifestante. Stolar diz que ela balançou o braço instintivamente após ser agarrada no seio direito por trás e que o vídeo usado pela acusação como prova não deixa claro a agressão de sua cliente.
A sentença para McMillan foi a mais severa entre os vereditos expedidos pela Justiça contra 56 manifestantes do Occupy. A polícia nova-iorquina agiu com violência contra manifestantes em várias ocasiões, mas até hoje, nenhum policial foi julgado pela justiça.
Assista ao vídeo usado pelos promotores para acusar a militante:
99% contra 1%
O movimento Occupy Wall Street teve início quando manifestantes ocuparam em 17 de setembro de 2011 o Parque Zuccotti, em Manhattan, no coração do sistema financeiro dos Estados Unidos.
O mote do movimento 99% contra 1% representa o fim da paciência da maioria com a espoliação do bem público pelos financistas. O detonador do movimento foi o socorro aos bancos na crise de 2008, realizado com dinheiro público. Enquanto isso, muitos executivos do setor bancário continuavam ganhando bônus exorbitantes e a juventude sentia na pele a precarização do mercado de trabalho.
Leia a crônica “O monstro Mercado”
O Occupy insere-se numa verdadeira onda de movimentos que levou muita gente de volta às ruas em todo o mundo. Em vários países, a população mobilizou-se e incendiou o debate político. Vimos isso na chamada Jornadas de Junho, no Brasil e na Primavera Árabe (em países do Oriente Médio e norte da África). Os 15M ou Indignados agitaram a Espanha, o #yosoy132 o México, o mesmo ocorreu em Portugal e na Turquia.
No livro Occupy, da Editora Boitempo, o professor Giovanni Alves explica quem são os integrantes desses novos movimentos: “no caso europeu, muitos dos manifestantes são jovens empregados, operários precários, trabalhadores desempregados e estudantes de graduação subjugados pelo endividamento e inseguros quanto ao seu futuro — eles constituem o denominado “precariado”; incluem-se também no caso do Occupy Wall Street, veteranos de guerra, sindicalistas, pobres, profissionais liberais, anarquistas, hippies, juventude desencantada, trabalhadores organizados etc”.
A origem dessa ebulição popular pode ser encontrada na Ação Global dos Povos, conhecida como AGP, que realizou sua primeira conferência em Genebra em 1998. No ano seguinte, na reunião da OMC em Seattle em 1999 e em Gênova, em 2001, os jovens ativistas surpreenderam o status quo vigente.
“Se o século 20 terminou com a queda do muro de Berlim, o século 21 começou com Seattle”
(sociólogo francês Edgar Morin)
Na luta contra Bush, FMI e a favor do Zapatismo, surgiu o esqueleto desses movimentos. Muitos comparam o que acontece hoje com os protestos que agitaram vários países no final dos anos 60. O jornalista Bernardo Gutiérrez, que estuda o movimento 15M na Espanha, explica a diferença entre a mobilização atual com a dos sixties, em textona Revista Fórum: “não necessitamos daquela utopia do maio de 68, aquela estúpida praia debaixo dos paralelepípedos que nunca apareceu, o 15M já construiu sua própria utopia: dezenas, centenas, milhares de microutopias em rede”.
A web exerce um papel essencial para a mobilização dos novos militantes políticos. As redes sociais, blogs e sites criam seu próprio fluxo de informações em organismos descentralizados em prol de novas relações sociais e políticas e liberdade de comportamento.
Em uma reunião do movimento Occupy, o filósofo esloveno Slavoj Zizek, tenta entender a motivação da nova geração de manifestantes:
“Em uma velha piada da antiga República Democrática Alemã, um trabalhador alemão consegue um emprego na Sibéria; sabendo que todas as suas correspondências serão lidas pelos censores, ele diz para os amigos: “Vamos combinar um código: se vocês receberem uma carta minha escrita com tinta azul, ela é verdadeira; se a tinta for vermelha, é falsa”. Depois de um mês, os amigos receberam a primeira carta, escrita em azul: “Tudo é uma maravilha por aqui: os estoques estão cheios, a comida é abundante, os apartamentos são amplos e aquecidos, os cinemas exibem filmes ocidentais, há mulheres lindas prontas para um romance – a única coisa que não temos é tinta vermelha.” E essa situação, não é a mesma que vivemos até hoje? Temos toda a liberdade que desejamos – a única coisa que falta é a “tinta vermelha”: nós nos “sentimos livres” porque somos desprovidos da linguagem para articular nossa falta de liberdade. O que a falta de tinta vermelha significa é que, hoje, todos os principais termos que usamos para designar o conflito atual – “guerra ao terror”, “democracia e liberdade”, “direitos humanos” etc. etc. – são termos FALSOS que mistificam nossa percepção da situação em vez de permitir que pensemos nela. Você, que está aqui presente, está dando a todos nós tinta vermelha.”
Fontes: livro Occupy e portal Democracy Now.
O mundo despertou do pesadelo neoliberal em Seattle