Neste ano, celebramos o centenário de nascimento dessa figura ímpar que tocou e cantou como ninguém a riqueza de sua terra. Desde jovem, Dorival Caymmi fez uso de seu ouvido absoluto para as cantigas e músicas ao seu redor e virou sinônimo da Bahia.
Dorival Caymmi nasceu em Salvador em 30 de abril de 1914 e morreu em 16 de agosto de 2008 no Rio de Janeiro.
Mesmo munido de enorme talento para a música, aos 24 anos, Caymmi embarca no navio Itapé rumo ao Rio de Janeiro para arrumar emprego como jornalista (já havia trabalhado no jornal “O Imparcial” na Bahia) e realizar o curso preparatório para o curso de Direito, em 1938. Consegue uma vaga em O Jornal, do Grupo Diários Associados, e conhece Carlos Lacerda e Samuel Wainer. Em 24 de junho de 1938 (dia de São João), Caymmi faz seu debut musical na Rádio Tupi cantando suas composições.
”Eu sou poeta porque existe uma Bahia onde eu nasci que está dentro de mim viva e que traz consigo meus melhores momentos da minha infância até hoje” (Dorival Caymmi).
Seu primeiro disco, intitulado “Canções Praieiras”, de 1954, que contém canções como “Quem vem para a Beira do Mar”, “O Bem do Mar” e “A Lenda do Abaeté”, são recheadas das experiências visuais do olhar de Caymmi ao rico cenário humano e natural de sua terra natal.
Em sua infância, com a separação dos pais, Caymmi foi criado junto ao pai pelas conhecidas mulheres de saia da Bahia, antigas escravas que após a abolição trabalhavam em casas de famílias ajudando na criação dos filhos dos patrões. Por forte influência dessas mulheres, ele participa na juventude das festas de terreiro, observando as roupas e comidas típicas.
Aos 17 anos, veraneia na praia de Itapuã e estabelece forte ligação com os pescadores, tornando-se amigo de muitos. Esse contato com a beleza natural o influenciou em toda sua carreira.
Em 1935, começou a participar de alguns programas na Rádio Clube da Bahia. Gilberto Martins, diretor da rádio, enxerga o talento do músico que passa a capitanear o programa “Caymmi e suas canções praieiras”. No ano seguinte, vence concurso de músicas para o carnaval baiano com o samba “A Bahia também dá”.
Em 1938, Caymmi passa a ser conhecido nacionalmente com o estouro do samba “O que é que a Baiana tem?” (letra iniciada em Salvador e terminada no Rio de Janeiro) na Rádio Tupi no Rio. O sucesso da canção a levou a integrar a trilha do filme Banana da Terra, de Wallace Downey. Foi Caymmi quem instruiu Carmen Miranda como dançar sua música com trejeitos típicos da Bahia. Foi a partir desse filme que ela passou a usar a fantasia de baiana que a imortalizou. O samba só foi incluído no filme porque Ary Barroso pediu uma boa quantia para liberar sua conhecida música Na baixa do sapateiro.
Em 1939, Caymmi gravou a canção em dueto com Carmen pela gravadora Odeon. No mesmo ano, estreou na Rádio Nacional a convite de Almirante e teve sua canção predileta, “O Mar”, aproveitada na peça “Joujoux e Balangandãs” de Henrique Pongetti. Após três meses na Rádio Nacional, o músico baiano foi contratado pela Rádio Mayrink Veiga.
Jorge, sempre Amado
Em relatos, Dorival não se recorda muito bem quem o apresentou a Jorge Amado, mas lembra de que foi na Avenida Rio Branco e, desde lá, a irmandade foi única e louvada. A conexão dos dois era tão grande que se complementavam culturalmente. As belezas de “É Doce morrer no Mar” e “Canção do Retirante” são perfeitos exemplos da mútua paixão entre esses dois gênios. São os principais, junto a Carybé, responsáveis pela construção de uma entidade cultural baiana.
“Caymmi é a parte musical da obra de Jorge Amado”
(Marília Trindade Barboza, biógrafa de Caymmi).
Músico amado e letrista sem igual, Caymmi ainda era bom de traço. Seu contato com as artes plásticas nasce na juventude quando começa a copiar figuras que apareciam em sua casa ou que encontrava na rua. Ele retratou os casarios, os coqueiros, praias, as sacadas e casas à beira- mar da paisagem baiana.
Caymmi e a Bossa Nova
Após uma curta dedicação somente aos seus desenhos, adota o samba-canção como expressão artística e começa a celebrar as boas “coisas” do Rio. Em 1955, grava o disco “Sambas de Caymmi” com músicas como Sábado em Copacabana e Rosa Morena que podem ser consideradas precursoras da Bossa Nova.
Em 1959, João Gilberto lança seu primeiro álbum Chega de Saudade, marco inicial do movimento Bossa Nova, com composições de Antonio Carlos Jobim, Vinicius de Moraes, Carlos Lyra e Newton Mendonça. João Gilberto grava também “Rosa Morena” de Caymmi.
“Amar o Caymmi era a coisa mais fácil que existia”.
(Sérgio Cabral, jornalista e crítico musical).
Caymmi e Tom, um verdadeiro caso de amor entre duas gerações da música brasileira, marcou o encontro entre o inovador cinquentão baiano e o jovem compositor carioca amado precocemente por seu talento. O disco “Caymmi visita Tom”, lançado pela gravadora Elenco em 1965, ainda contou com a participação dos filhos de Dorival: Nana, Dori e Danilo.
Em 1960, Dorival Caymmi, Jorge Amado e Carybé abraçam o candomblé e suas tradições. A valorização da cultura iorubá está descrita em algumas de suas letras como: “Festa de Rua”, “Rainha do Mar” e “Dois de Fevereiro”. Os três amigos ganham o título honorífico de “Obá de Xangô” por serem considerados seres de grande luz e preciosidade na terra. Em 1972, Caymmi compõe a letra de “Oração de Mãe Menininha”, homenageando Mãe Menininha do Gantois, uma grande Iyálorixá brasileira.
“A oxum mais bonita, a estrela mais linda e o sol mais brilhante”
(trecho da música “Oração de Mãe Menininha”).
“O que que a baiana tem?”- Dorival Caymmi
Dorival Caymmi explica como surgiu “Maracangalha” e a canta
“Marina” – Dorival Caymmi