O primeiro contato que tive com o escritor Ricardo Lísias foi em fevereiro deste ano na revista Piauí ao ler um texto sobre como a corrida e a participação na corrida de São Silvestre o ajudaram a superar um divórcio tumultuado. Me identifiquei com o texto na hora, também corro há mais de um ano, me esfalfei na SS 2011 e isso também me ajudou a superar problemas pessoais.
Ao comprar um livro seu, titubeei, O Livro dos Mandarins, de 2009, sobre as peripécias de um executivo na China não me interessou e me incomodei com o título de O Céu dos Suicidas, sempre tive vontade de ler O Suicídio de Durkheim mas o palavrão que nomeia o livro sempre me afastou. Arrisquei O Céu dos Suicidas, lançado em 2012. Lá, encontrei emoções escancaradas, revolta e muita ansiedade.
O narrador, xará do escritor, está cheio de culpa pelo suicídio de seu grande amigo, André. Professor universitário e expert em coleções, ele luta contra a insônia e um sentimento de urgência que beira ao pânico herdado de seu amigo suicida que sofria de uma “ansiedade incontrolável” e se internou de forma voluntária em uma clínica psiquiátrica. Talvez a endorfina da corrida não tenha matado por completo o desespero que gera esse maldito estado mental no escritor. Desculpe, não devo, mas sucumbir na salada entre narrador e escritor é inevitável.
A desesperança e certo niilismo recheiam o livro. Como o escritor, o narrador também é descendente de libaneses, e parte para Beirute em busca de um tio-avô terrorista, história que se revela irreal pela boca de sua mãe, que também dá um dos melhores conselhos para qualquer intelectual misantropo: “você sempre se achou melhor que os outros, nunca aceitou os próprios limites e quando é contrariado age como um moleque”.
Sua mãe também exige que ele vá ao psiquiatra em troca de sua passagem de volta de Beirute. Ricardo concorda em ir mas seu inconformismo com o suicídio de André o sufoca e ele agride um padre, briga com espíritas e discute com o psiquiatra: “você não tem o direito de medir a minha dor! vai tomar no cu, seu filho da puta, psiquiatra de merda”. Resposta do psiquiatra: “não é o mundo que grita, Ricardo, é você”.
Após ler o livro de Lísias, curioso, busquei seu perfil no facebook. Encontrei dezenas de fotos abertas e disponíveis. Deve ser um perfil fake, é não. Encontro desde fotos de uma corrida noturna da qual também participei (fui oito minutos mais lento que ele, preciso treinar mais, já passei dos 40, Lísias ainda não, me conformo) até fotos de um André, que morreu em 2008. Repito para mim mesmo: “o que li foi ficção, um romance!” Estranhamento.
Sempre questionei sobre a real necessidade do isolamento midiático de dois escritores que admiro, Rubem Fonseca e Dalton Trevisan, mas talvez o fascínio da literatura realmente resida no fato de nunca sabermos o que o escritor viveu, criou ou imaginou.