Entre o preparo de um misto quente e um cheese-burger, o chapeiro da padaria reclama ao balconista: “não quero mais ver mais essas Olimpíadas, Brasil só perde”. O balconista responde: “é verdade, e o Corinthians vai mal, hein, só empatou ontem com o Atlético de Goiás”. Não tem jeito, para brasileiro, papo sobre esporte sempre termina em futebol. Mesmo nas Olimpíadas.
Cheguei a ouvir a sugestão de um torcedor mais exaltado o cancelamento dos jogos do Campeonato Brasileiro de Futebol nestas duas semanas para focarmos nossas atenções em Londres. Argumentos esdrúxulos como esse fazem um pouco de sentido ao perceber que, durante 3 anos, 11 meses e duas semanas, 80% do espaço da mídia esportiva brasileira é latifúndio (muitas vezes improdutivo) do futebol. A hegemonia do futebol encurrala os outros esportes. Brasileiro gosta de esporte mas gosta ainda mais de ganhar. E o futebol geralmente entrega o que promete.
No início das Olimpíadas, os brasileiros até encheram-se de ufanismo e otimismo após o primeiro dia brilhante do país com três medalhas, uma de ouro, uma de prata e uma de bronze. Juntou-se a isso a naturalidade que Sarah Menezes encarou sua medalha de ouro, a judoca chegou a dizer que a luta decisiva foi fácil. Tudo não passou de um falso presságio de que a situação do esporte brasileiro finalmente tinha mudado.
Faltam dois dias para o encerramento das Olimpíadas e os resultados mostram que há um longo e tortuoso caminho para o Brasil se tornar uma potência olímpica. Infelizmente, ainda não aproveitamos a diversidade de nosso povo miscigenado, que nos proporciona uma multiplicidade de biotipos para as mais variadas práticas esportivas.
Na capital inglesa, tivemos boas surpresas, decepções, confirmações e micos. O top mico atende pelo nome de Fabiana Murer. Depois da confusão sobre o sumiço da vara em Pequim, Murer ‘refugou’ como cavalo xucro e simplesmente não pulou no salto decisivo. Culpou o vento. Com furacão ou tsunami, Murer tinha que pular.
A estrela do salto com vara, a russa Yelena Isinbayeva, que também decepcionou com seu bronze, disse em entrevista que não entendeu a atitude da atleta brasileira. Segundo a russa, Murer enfrenta algum problema físico ou psicológico grave. Outro mico foi protagonizado por Diego Hypólito, demonstrando falta de controle emocional, fracassou feio na segunda Olimpíada seguida. Desta vez, teve uma queda patética, de lado.
Outras decepções ficaram a cargo de César Cielo, derrotado na final dos 50m livre, amargou o bronze, e o do atletismo. Responsável por várias medalhas em outras edições olímpicas, desta vez, os brazucas só alcançaram duas finais (salto em distância masculino e 4×100 feminino) no Estádio Olímpico. Em recuperação de uma contusão, a medalhista de ouro em Pequim, Maurren Maggi, não conseguiu ficar entre as 12 melhores no salto em distância.
O vôlei, tanto de quadra como de praia, e o judô confirmaram o bom desempenho e mais uma vez trazem boa parte de nossas medalhas. Agora, o otimismo para melhores resultados em 2016 justifica-se por alguns ótimos resultados da nova geração de atletas, com destaque para as espetaculares medalhas dos irmãos Falcão e Adriana Araújo no boxe e de Arthur Zanetti nas argolas da ginástica olímpica.
Festival de Desculpas e bolsa-atleta
Durante as duas semanas de Olimpíadas, o Febeapá (Festival de Besteiras que Assola o País), criado por Stanislaw Ponte Preta na década de 60, foi substituído por um Festival Avassalador de Desculpas. Deprimente. Se classificar para uma Olimpíada não é fácil, se o atleta está lá e esforçou-se em busca de seu melhor desempenho, não deve pedir desculpas a ninguém.
Como as Olimpíadas concentram dezenas de corridas, jogos e lutas em poucos dias, as derrotas naturalmente são em maior número do que as vitórias, ainda mais para um país com pouca tradição na grande maioria dos esportes olímpicos como o Brasil. Com isso, pulularam na web textos oportunistas cheios de complexo de vira-lata (o mesmo se ouviu na cerimônia de abertura: “imagina no Rio, será um vexame”, o brasileiro é recordista em auto-depreciação). Muito se escreveu sobre o quixotismo dos atletas brasileiros e de que falta tudo e mais um pouco aos heroicos atletas do país. Auto-piedade não resolverá a situação.
Com certeza, falta muito apoio e estrutura e qualquer atleta brasileiro que alcança índice e se classifica para as Olimpíadas dedicou sua vida ao esporte. Sem a prática massiva de esportes, seja nos clubes, parques, universidades, o Brasil nunca será forte nas Olimpíadas. Faltam também centros de excelência, locais onde os atletas isolem-se do mundo com um único objetivo: treinar. Há quatro anos dos Jogos Olímpicos do Rio, sem dúvida, a situação do atleta brasileiro melhorou. Falta muito, mas melhorou.
Mais de 4 mil atletas recebem o bolsa-atleta, o que custará R$ 60 milhões de reais neste ano. Segundo o site da Caixa Econômica Federal, o bolsa-atleta é destinado aos atletas que não contam com patrocínio e varia entre R$ 370 e R$ 3100 por mês.
Dilma Rousseff informou na abertura dos jogos de Londres que o governo investirá neste ano R$ 200 milhões na modernização de centros de treinamento e em tecnologia esportiva, com a finalidade de melhorar a formação e preparação de atletas.
Dilma também destacou o investimento de R$ 1 bilhão na construção e cobertura de mais de 2.800 quadras esportivas em escolas públicas em todo o país. De acordo com Dilma, até 2014, serão seis mil quadras construídas e quatro mil cobertas. Se são só promessas, o tempo dirá, mas, infelizmente, já sabemos que parte dessa dinheirama ficará no bolso de meia dúzia de cartolas.
Hoje é sexta e o Brasil já bateu pelo menos seu recorde de medalhas que era de Pequim, temos garantidas 16 medalhas. Ia me esquecendo, amanhã de manhã, tem final do futebol masculino em busca de sua inédita medalha de ouro. Mas futebol tem todo dia.