Zona Curva

A pedra da loucura só está na cabeça do outro?

por Fernando do Valle

Por volta do século XV, charlatões pretendiam curar a insanidade com uma pequena incisão no crânio, como em um passe de mágica, retiravam a pequena pedra da loucura da cabeça do desajustado. A prática falsamente assegurava aos outros pacatos cidadãos a proteção dessas figuras inadequadas que desestabilizavam suas convicções.

A catarse do público no espetáculo da retirada da pedra da loucura assemelha-se aos rituais de pastores televisivos, a purgação dos males do mundo em poucos minutos regozija a audiência e traz conforto para enfrentar as agruras reais, muitas vezes insuportáveis.

xtração da pedra da loucura Hieronymus_Bosch
A extração da pedra da loucura” (data provável: entre 1475 e 1480), quadro do holandês Hieronymus Bosch; a inscrição do quadro é “Mestre, extrai-me a pedra, meu nome é Lubber Das”, Lubber Das era um personagem tolo da literatura da época

https://www.youtube.com/watch?v=6Hs8_oqVfZI

Hoje muitos clamam para a retirada da pedra da loucura de seu oponente, daquele que não concorda com sua visão de mundo, o acusador não tem pedra no cérebro, o equilíbrio é sua tônica em sua conduta impecável, como diria Sartre, “o inferno são os outros”.

As crenças do outro incomodam e o desejo de ordem domina a mente de muitos, que confiam em suas máscaras construídas pelo medo, com elas podem circular incólumes pelas ruas rumo ao shopping mais próximo.

Nas redes sociais, o opositor é o louco, “como esse cara pode acreditar nisso”, com isso formam-se pequenas bolhas em que os iguais se protegem dos loucos de outras bolhas.

O diálogo cessa com o outro que não se encaixa no que pretendo para o MEU país, para a MINHA família, o outro faz parte do time adversário e vivemos em uma eterna briga de torcidas de futebol.

“Uma operação na cabeça” (1550) do pintor holandês Pieter Bruegel

Sem loucura, não há arte, não há utopia, não há vida.

Doença mental sob o desgoverno Bolsonaro

Sair da versão mobile