por Carlos Castilho
A imprensa mundial está enfrentando um novo e poderoso concorrente na guerra pelo controle do fluxo de informações levadas ao público. Trata-se nada mais nada menos do que os governos nacionais, um velho e conhecido aliado da grande imprensa e que agora, na era das redes sociais, descobriu que não precisa mais depender do humor político dos donos de conglomerados midiáticos.
Quem escancarou a nova estratégia de comunicação pública foi o presidente norte-americano Donald Trump que transformou o Twitter e o rótulo fake news (notícias falsas) nas principais ferramentas para enfrentar a grande imprensa norte-americana, também conhecida como o Quarto Poder. O bate boca entre Trump e jornais como The New York Times e The WashingtonPost, bem como a rede de TV CNN, não é uma mera questão de divergências entre um presidente conservador e uma imprensa liberal.
Trata-se da quebra de uma parceria histórica que vigora desde o século XIX onde imprensa e governos procuraram apoiar-se mutuamente por meio de uma estratégia comum de alimentação e monitoramento da agenda pública de debates visando o controle do fluxo de notícias levadas ao público. Além da coincidência de interesses pontuais, os parceiros compartilham posições ideológicas comuns baseadas no ideário democrático liberal.
A internet quebrou o monopólio da imprensa no controle do fluxo de notícias mas foi só depois que os políticos conservadores descobriram como usar as redes sociais para uma comunicação direta com os seus eleitores e simpatizantes, que o rompimento entre as duas partes se transformou num problema político de primeira grandeza.
A parceria governos/imprensa foi muito proveitosa para ambos. A imprensa, especialmente os grandes jornais e emissoras de TV com alcance nacional, recebeu fatias milionárias da publicidade estatal oferecendo em troca um tratamento preferencial aos interesses dos governantes de turno. O benefício mútuo consolidou uma aliança que sempre foi negada , mas que informalmente deu origem a um modelo político que poderia ser definido como liberal conservador, apesar de assumir formas diferenciadas por país.
A partir da virada do século XXI , partidos e movimentos de extrema direita bem como de políticos de tendência populista descobriram que as redes sociais e a internet podiam substituir a imprensa na intermediação com o público. Isto favoreceu o protagonismo de políticos como Trump, mas também de outros líderes de direita como Lech Kaczynski, presidente da Polônia, e Viktor Orban, primeiro ministro da Hungria, sem falar em dirigentes de partidos ultra conservadores na França, Holanda, Suécia e Itália.
O Trump brasileiro
Aqui no Brasil, Jair Bolsonaro está usando a mesma estratégia para divulgar seu discurso extremista, sem depender das simpatias da grande imprensa nacional. Jornais como a Folha de São Paulo, O Globo e a Rede Globo de TV, por enquanto, mantém-se neutros no que se refere à cobertura da campanha eleitoral do ex-capitão do exército. Mas se ele conseguir se eleger , a divergência de interesses econômicos e políticos pode azedar, e muito, a relação entre Bolsonaro e a imprensa.
A batalha pelo controle do fluxo de notícias tende a se agravar porque os interesses políticos e econômicos agregados aos grandes conglomerados da comunicação mostram-se dispostos a usar todas as armas possíveis para não perder sua hegemonia. Mas por outro lado, as plataformas digitais de comunicação vieram para ficar e a dúvida agora é saber quem vai utilizá-las melhor do ponto de vista político e ideológico.
Os movimentos e grupos extremistas, especialmente os de direita e os fundamentalistas tem mostrado muito mais agilidade e eficiência no uso das redes sociais como ferramenta para influir na formação da opinião pública. Com isto a batalha pelo controle do fluxo de notícias capazes de condicionar o debate público acabou se transformando também num confronto ideológico, que ainda está muito longe de acabar.
Publicado originalmente no MEDIUM.